Um experimento que mostrou como o cérebro faz para gerenciar as memórias reforça a teoria de que o processo é semelhante ao que ocorre em um computador.
O trabalho, coordenado pelo neurocientista Sidarta Ribeiro, diretor do IINN (Instituto Internacional de Neurociências de Natal), flagrou o momento em que algumas estruturas cerebrais são ativadas para 'salvar' dados.
Ribeiro, diferentemente de outros cientistas, não mostra receio em comparar mente e máquina, mas explica por quê: 'É claro que não é a mesma coisa, mas é a melhor metáfora que a gente tem', diz.
'O cérebro é um computador, só que é um computador construído com regras diferentes.'
Uma dessas regras, porém, parece ser muito semelhante. Em 2004, Ribeiro já havia proposto juntamente com o colega Miguel Nicolelis, da Universidade Duke, nos EUA, uma teoria nesse sentido.
Segundo eles, duas estruturas cerebrais distintas o hipocampo e o córtex-- funcionariam de maneira semelhante aos centros de memória de um computador a memória RAM e o disco rígido.
Uma série de experimentos nos últimos quatro anos reforçou a hipótese, e em um estudo publicado nesta sexta-feira na edição de lançamento da revista "Frontiers in Neuroscience", Ribeiro e Nicolelis detalham as evidências experimentais em favor da analogia.
Uma das principais pistas é que os cientistas detectaram pela primeira vez o momento em que o cérebro transfere informações do hipocampo para o córtex -como se fosse um software de edição "salvando" um texto- num breve período, de cinco a dez segundos, durante o sono.
A descoberta só foi possível porque os cientistas conseguiram analisar ao mesmo tempo a atividade elétrica dos neurônios e a ativação de genes que fazem essas células produzirem as conexões de longo prazo para as memórias duradouras.
"Foi a primeira vez que alguém fez uma combinação de duas técnicas que, em si mesmas, já são difíceis", diz.
Trabalhando com ratos que eram submetidos a experimentos de aquisição de memória, os pesquisadores conseguiram mostrar que a atividade elétrica do hipocampo induzia o córtex a ativar algumas horas depois, durante o sono os genes necessários para as conexões duradouras.
De quebra, Ribeiro, Nicolelis e colegas ainda conseguiram mostrar que essas duas etapas ocorrem em fases distintas do sono.
Durante a fase chamada de sono de ondas lentas o sono pesado o hipocampo (porta de entrada do aprendizado) prepara as memórias para serem enviadas ao córtex, e se manifesta por meio de atividade elétrica.
Durante o chamado sono REM (movimento rápido dos olhos, em inglês), ativa os genes que produzem as proteínas necessárias às conexões da memória de longo prazo.
"É a primeira evidência eletrofisiológica de que uma memória persiste e reverbera durante o sono no córtex e não no hipocampo", diz Ribeiro. "Durante o sono, o córtex continua "lembrando", mas o hipocampo não", explica.
A transmissão de dados de uma estrutura à outra foi detectada quando o grupo mediu a atividade elétrica dos neurônios e descobriu que em um breve momento eles entravam em sincronia, disparando impulsos na mesma freqüência."Há uma correlação estreita entre a amplitude das oscilações neurais nessa freqüência, de 10 a 14 hertz, e a expressão dos genes [necessários à fixação de memórias]", diz Ribeiro.
Ao mesmo tempo em que trabalha com roedores, o cientista conduz em Natal experimentos com pessoas para tentar entender o papel dos sonhos nesse processo.
Ribeiro, um neurocientista que se interessa pela teoria da psicanálise algo raro em seu campo de pesquisa, diz que quer tentar "resgatar Freud no que ele tinha de mais cientifico", ou seja, tentar entender o papel dos sonhos na biologia humana.
Nenhum comentário:
Postar um comentário